
“É que ao pé de um puto de quatro anos, eu consigo parecer o Cristiano Ronaldo”
Dir-me-ão que andar aos pontapés numa sala de jantar 15 minutos antes da hora de dormir não faz parte dos índices remissivos das obras de pediatria. É um facto. Não só é uma actividade pouco recomendável para quem seja apreciador da integridade física do seu mobiliário, como os miúdos vão para a cama mais acelerados do que Lewis Hamilton na recta da meta de Silverstone. Mas o que é que vocês querem que eu faça? Não consigo resistir. E não, não é por causa deles. É por causa de mim.
É que eu… sempre fui uma lástima a jogar futebol. Só que ao contrário da maior parte das pessoas que são uma lástima a jogar futebol, sempre adorei jogar, e joguei a vida toda. O que só torna a minha incapacidade mais humilhante. É verdade que desde que descobri que tenho uma perna 17 milímetros mais curta do que a outra passei a desculpar cada fífia com as deficiências do meu centro de gravidade. "Para um tipo meio manco até não está mal", tento convencer-me a mim próprio. Sem sucesso.
Mas desde que o Tomás despertou para a bola, tudo mudou na minha vida. É que ao pé de um puto de quatro anos, eu consigo parecer o Cristiano Ronaldo. Simulo que vou para a esquerda, vou (muito devagarinho) para a direita, e o meu filho fica pregado ao chão, espantadíssimo com a minha técnica individual. Depois avanço para a baliza e pimba!, um estouro para o fundo das redes (ou melhor: uma bola a esbarrar com estrondo na porta da cozinha). O Tomás olha para mim com um orgulho genuíno, como se eu fosse um génio do futebol, e eu sinto-me em Old Trafford, com 75 mil pessoas a aplaudirem-me de pé. Claro que daqui a dois anos ele já vai conseguir tirar-me a bola. É aproveitar enquanto dura.
Por:João Miguel Tavares, Jornalista (jmtavares@cmjornal.pt) em www.cmjornal.xl.pt
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